Portugal - Do Estado Novo ao PREC - Maria Armanda Falcão, filha de um oficial oposicionista ao regime de 28 de Maio de 1926, trilhou os passos familiares na contestação ao regime e inclusive foi casada com um dos nomes mais sonantes do pós 25 de Abril na esquerda, José Manuel Tengarrinha, líder do MDP/CDE, um partido aliado umbilical do PCP de Álvaro Cunhal, contestatária e combatente da tentativa da esquerda militar de instalar uma ditadura comunista na revolução
‘VERA LAGOA - Um diabo de saias’
De Maria João Câmara
Edição
Lisboa 2021
Livro com 480 páginas, ilustrado e em muito bom estado de conservação. Novo. Excelente.
De muito difícil localização.
SINOPSE:
“Poucas mulheres marcaram tanto o século XX português como Vera Lagoa. De carácter destemido e opiniões fortes, a sua voz livre foi uma lufada de ar fresco no jornalismo português. Na coluna Bisbilhotices, no ‘Diário Popular’, comentou a sociedade do final do Estado Novo de forma atrevida, mordaz, indiscreta ao ponto de provocar o escândalo. No pós-25 de Abril, foi das raras vozes independentes, dissonantes, sem compromissos nem cálculo, que se atreveu a criticar os novos poderes instituídos.
Pela mão da historiadora Maria João da Câmara chega-nos finalmente a sua biografia. De uma menina marcada pela figura trágica do pai até à jovem precoce no trabalho, no casamento e na maternidade; de uma habitué dos ambientes intelectuais e artísticos sofisticados da Lisboa do pós-guerra - onde encontra Amália Rodrigues, Sttau Monteiro, Cesariny, Natália Correia, Ary dos Santos e José Manuel Tengarrinha, o amor da sua vida - à sua entrada nos meios oposicionistas e apoio à candidatura de Humberto Delgado, em 1956.
Da invenção por desespero do pseudónimo Vera Lagoa para o ‘Diário Popular’ de Pinto Balsemão, à sua grande esperança, e posterior desilusão, com o regime democrático, registadas de forma corajosa e contundente no seu jornal ‘O Diabo’, ‘Vera Lagoa - Um diabo de saias’ é o registo do percurso tão notável quanto acidentado de uma mulher à frente do seu tempo.
Fruto de uma pesquisa admirável com recurso a diversas fontes históricas, nomeadamente ao arquivo pessoal de Vera Lagoa e a entrevistas com familiares, amigos e colaboradores que a conheceram de perto, através da história desta mulher, Maria João da Câmara dá a conhecer uma sociedade, se não desconhecida, pelo menos esquecida, que vale a pena conhecer: a sociedade portuguesa na segunda metade do século passado.”
A Autora:
“MARIA JOÃO DA CÂMARA é doutorada em História pela Universidade Nova de Lisboa – Faculdade de Ciências Sociais e Humanas.
Autora de vários trabalhos científicos na área da História e dos Arquivos de Família, além dos romances:
- Um Príncipe Quase Perfeito,
- Crónica de Amor e Mar,
- O Pecado e a Honra e Memórias Perdidas de Catarina de Bragança,
Publicou ainda os ensaios Orey:
- Uma Família, Uma Empresa e Cristo Rei,
- Espiritualidade e História.
São ainda da sua autoria as seguintes biografias:
- Pedro de Figueiredo (1657 1722) – Uma Biografia;
- João Branco Núncio (1901 1976) e
- Maria José Nogueira Pinto, Uma Vida Invulgar.”
VERA LAGOA - Biografia
“Vera Lagoa (pseudónimo de Maria Armanda Pires Falcão), (Ilha de Moçambique, 25 de Dezembro de 1917 – Lisboa, 19 de Agosto de 1996), foi uma jornalista, cronista e empresária portuguesa. Foi a primeira locutora da televisão em Portugal. Foi a primeira jornalista a ser processada por um presidente da república.
Ocupação
Jornalista, cronista e empresária
Primeiros anos
Maria Armanda Falcão nasceu em Moçambique quando esta ainda era colónia de Portugal, filha de Armando Augusto Pires Falcão (Lisboa, São Sebastião da Pedreira, 21 de Novembro de 1880), oficial do exército, e de sua segunda mulher Beatriz Lúcia (Lisboa, São José), e irmã de Armando Pires Falcão (Ilha de Moçambique, 18 de Agosto de 1916). Do primeiro casamento de seu pai, com Palmira Leopoldina de Pinho (Lisboa), tinha uma meia-irmã mais velha, Maria Isabel Pires Falcão (Lisboa, São José, 1905), casada na Ilha de Moçambique a 21 de Maio de 1921 com Fortunato Abrantes de Andrade Pissarra.
Devido às prisões e deportações do seu pai durante a 1.ª República, Maria Armanda não teve oportunidade de prosseguir os estudos para além da 4.ª classe da instrução primária, sendo que a cultura e conhecimentos que depois adquiriu se ficaram a dever ao auxílio de amigos do seu pai e ao facto de ser autodidacta. Devido às dificuldades financeiras da sua família (o pai fora expulso do exército, no posto de major, tendo sido reintegrado postumamente, depois do 25 de Abril, no posto de coronel), Maria Armanda começou a trabalhar muito jovem, como secretária.
Primeira locutora da RTP
Apareceu ao lado de Raul Feio na primeira transmissão experimental da RTP do dia 4 de Setembro de 1956, já com quase 40 anos, na Feira Popular de Lisboa, então na Palhavã, onde hoje é a estação do metropolitano Praça de Espanha. Nesta noite, apresentou um documentário sobre ourivesaria.
Tudo começou quando ela era secretária e estavam à procura de uma locutora. Foi falar com o responsável da emissora e disse-lhe que estava interessada nesse lugar. Passou nos testes, mas com uma condição: não podia aparecer de cabelo preto. Afirmou que a transmissão tinha corrido bem e os cenários eram tão simples que eram de plástico. Era tudo improvisado, com 20 televisores espalhados pela Feira. Como não havia o VT, a transmissão foi gravada em filme. Maria Armanda Falcão tinha todos os predicados para ser uma boa locutora, contudo, foi dispensada dessa função, por ‘excesso de personalidade’: recusava-se a dizer, no final da emissão, ‘Até amanhã, se Deus quiser’, por ser agnóstica.
Maria Armanda Falcão opôs-se ao Estado Novo, ajudando os presos políticos e apoiando a candidatura de Humberto Delgado em 1958.
Cronista social
Frustrada a sua carreira de locutora televisiva, tornou-se jornalista no Diário Popular, com a sua crónica social Bisbilhotices (título que ela detestava e que lhe foi imposto sem o seu conhecimento). Foi então que surgiu o seu pseudónimo Vera Lagoa, sugerido pelo seu amigo Luís de Sttau Monteiro, durante um jantar: 'Vera', por significar autêntica ou verdadeira, e 'Lagoa' por ser o nome do vinho que estava na mesa. Os seus artigos eram marcadamente irreverentes, e acabou por sair do Diário Popular, de relações cortadas com Francisco Pinto Balsemão, devido às constantes interferências censórias do administrador.
Directora do semanário ‘O Diabo’
Depois do 25 de Abril, durante algum tempo foi militante do Partido Socialista, mas depressa se desiludiu com o novo regime democrático. Mulher vertical, independente e insubmissa, conhecedora dos bastidores da sociedade portuguesa e de muitas das suas figuras destacadas da cultura da política, ficou revoltada com a quantidade de oportunistas e de hipócritas que dantes eram apoiantes, cumpridores e agradecidos do Estado Novo e que de um momento para o outro se tornaram vociferantes radicais da extrema-esquerda, perseguidores de quem não lhes seguisse o exemplo. Denunciou alguns deles no livro ‘Revolucionários que Eu Conheci’.
Escreveu no semanário ‘Tempo’ dirigido por Nuno Rocha, inflamados artigos contra o PREC e contra as figuras do regime, como Vasco Gonçalves ou Costa Gomes. Mais tarde, sentindo-se cerceada, saiu e em 10 de Fevereiro de 1976 fundou o seu próprio jornal, de que foi directora vitalícia, ‘O Diabo’, homónimo de um jornal dos anos 30, anti-salazarista.
«Não gosto de si. O senhor é muito feio!», assim terminava o editorial O senhor Gomes de Chaves, publicado n’O Diabo’, em Fevereiro de 1976, sobre o então Presidente da República, Costa Gomes. Passadas poucas semanas, o Conselho da Revolução suspendia o jornal.
Vera Lagoa cria então novo semanário, ‘O Sol’, com a mesma linha editorial, que sofreu um atentado à bomba logo depois dos primeiros números, tendo ficado com sequelas cardíacas. Mudou então a redacção e a impressão do jornal para o Porto, onde esteve durante algum tempo. A suspensão d'O Diabo’ terminara, entretanto, voltando a ser publicado a partir de 16 de Fevereiro de 1977.
Mulher de causas, Vera Lagoa, defendeu as vítimas da descolonização e os injustiçados do PREC, como Antónia Ramalho, mãe de António Ramalho Fialho, o homem que foi, bárbara e arbitrariamente, assassinado a tiros de G3, juntamente com Conceição Santos, sua companheira de viagem, gravemente ferida, por militares às portas do RALIS, a 12 de Março de 1975, depois de terem ido ao local apreciar os danos causados pelo ataque da véspera. Foi a promotora das manifestações anuais patrióticas do feriado 1.º de Dezembro. Manifestou-se empenhadamente contra a reeleição de Ramalho Eanes em 1980, pelas suas atitudes políticas ambíguas, por ser apoiado pelos comunistas e por querer perpetuar o poder do Conselho da Revolução. Pugnou por uma investigação apurada à queda do avião que matou Sá Carneiro e seus acompanhantes, que, juntamente com Augusto Cid, ela considerava ter sido um atentado bombista.
Vida pessoal
Foi casada com Francisco António de Gusmão Fiúza, José Manuel Tengarrinha e José Rebordão Esteves Pinto. Teve um filho do primeiro casamento, Armando Falcão de Gusmão Fiúza, e quatro netos: José Manuel Fiúza, Rita Fiúza (Al-Merei, pelo casamento), Pedro Fiúza e Clara Fiúza.
Morreu de ataque cardíaco, em 1996, aos 78 anos.
Obras
1968 - ‘Bisbilhotices’;
1975 - ‘Crónicas do Tempo : 5-6-75 - 2-10-75’;
1977 - ‘Revolucionários que eu conheci’;
1978 - ‘A cambada: crónicas da liberdade’, adaptadas e baseadas nos artigos da autora publicados em ‘O Diabo’, ‘O Sol’, ‘O País’ e ‘O Diabo’;
1980 - ‘Eanes nunca mais!’;
Reconhecimento
Em 1977, o cartoonista José Vilhena publicou o livro ‘Vera Lagoa meteu a pata na poça!’ que compilava uma série de fictícias respostas satíricas das personalidades visadas por Vera no seu livro ‘Revolucionários que Eu Conheci’.
Foi capa da revista ‘Nova Gente’ que substitui a revista ‘Gente’ depois do 25 de Abril.
É uma das personalidades referidas no livro ‘Lisboa, Anos 70’, de Joana Stichini Vilela, publicado em 2014.
É também mencionada em livros como ‘O Botequim da Liberdade’, ‘Faça-se Justiça!’, ‘Memórias da vida e da rádio de afectos’, entre outros.
Foi retratada na série ‘3 Mulheres’ do realizador português Fernando Vendrell pela actriz Maria João Bastos, que estreou na RTP em 2018. Snu Abecassis e Natália Correia foram as outras duas mulheres homenageadas pela série.
Em 2021, foi lançada pela Oficina do Livro, a sua biografia escrita pela historiadora Maria João da Câmara.
Uma das ruas da freguesia de São Domingos de Benfica (Lisboa), tem o seu nome.”
Do ÍNDICE:
INTRODUÇÃO
PRIMEIRO NASCIMENTO
1. Origens: roteiro dá infelicidade
2. Inquietudes: O tempo da descoberta
3. Oposições e riscos. O tempo das lágrimas
4. O homem que mais amou
SEGUNDO NASCIMENTO
1. Emerge Vera Lagoa
2. Como e sobre o que escreve Vera Lagoa ?
3. Setembro. Doce Setembro
4. Uma primavera que não chegou
5. Um (ou dois) regressos à RTP
6. Concursos para que vos quero ?
TERCEIRO NASCIMENTO
1. “Como será a Liberdade?”
2. As desilusões no ‘TEMPO’
3. Um Diabo de saias
4. Lagoa n’O PAÍS’ dos revolucionários
5. A pena como uma espada. O regresso d’O DIABO’
6. ‘Em Abril… processos mil’
7. ‘A rua também é nossa’. O 1.* de Dezembro
8. ‘As estórias edificantes que tenho para contar’
9. Os ‘gloriosos’ anos 1980
10. Velhos temas, novas realidades
11. O fim de um ‘duelo com o próprio destino’ (os anos 1990)
Agradecimentos
Fonte e Bibliografia
NOTAS
Índice Onomástico
Preço: 37,50€;
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